Como uma âncora

Nessa tarde eu estava completamente sem vida, mais até do que de costume. Rondava pela casa sem ter realmente algo que fazer, simplesmente esperava que me ocorresse alguma idéia e pudesse aproveitar apenas um momento durante todo o dia.
Sem nada em mente, me atirei naquele velho e desconfortável sofá bege. Era como se estivesse em um estado vegetativo pois não sentia nem pensava nada, nem tampouco tinha vontade.
Fiquei assim durante alguns bons minutos até voltar parcialmente ao mundo. Me sentia incômoda ali, pensei em mudar de posição mas até isso meu corpo não permitia, afinal, de quê serviria? Daqui a alguns minutos voltaria a me sentir incômoda do mesmo jeito e voltaria a mudar de posição. Pensava em ir ler ou ir ao cabeleireiro, como estava me prometendo faziam já umas boas semanas, porém nada disso conseguia fazer com que valesse a pena me levantar. Ficava pondo desculpas bastante convenientes a todas as coisas que pensava que seria uma boa idéia para passar o tempo.
-Ah, eu não vou perder meu tempo! A essas horas todas essas velhas estupidas vão estar saindo de casa para ir no cabeleireiro. O salão vai estar cheio e vou ter que ficar esperando uma hora para ser atendida...! -pensei como primeira desculpa. Quando estava aí pela quarta ou quinta, ouvi alguns passos se aproximando e passando pela sala. Os passos foram direcionando-se até a porta de saida, a pessoa pegou o molho de chaves e finalmente saiu dando um belo portaço.
Me senti incrivelmente sozinha durante os primeiros cinco minutos, como se estivessem fechando aquela porta bem na minha cara me deixando presa em um lugar onde eu não tinha absolutamente nada o que fazer para que pudesse me sentir minimamente um ser vivo.
E assim estive eu durante muito tempo, presa em um labirinto por não saber em qual direção ir. Ficava ali parada naquele mesmo lugar dia trás dia, e quando decidia caminhar um pouquinho tomando uma direção, logo recuava ao me dar conta de que não sabia aonde queria chegar. Poderia voltar atrás e sair por onde entrei, ir procurar a saida ou chegar ao centro.
E enquanto eu estava com todo esse dilema não conseguindo me decidir, eu ficava alí assistindo a todas as pessoas que eu conheci passando por mim e escolhendo um dos caminhos sem nenhuma dificuldade, até desaparecer completamente do meu campo de visão. Ficava alí sentada no chão de terra olhando para os meus pés quando as pessoas paravam de passar, e diversas vezes me perguntava quando seria que eu voltaria a andar.

Não encontrava nada que me motivasse a me levantar dalí. Os dias passavam e era mais ou menos a mesma rotina: acordava tarde, ia no banheiro, comia algo, me deitava no sofá, cochilava, comia alguma bobagem e ia dormir. E mais algumas idas no banheiro.
Estava ficando cansada demais por estar sempre assim, mais morta do que viva, mas ao mesmo tempo eu não conseguia me propor a fazer nada a respeito. Tinha vários pensamentos de coisas que gostaria de fazer, mas eu simplesmente não conseguia por nenhuma delas em prática.
Foram passando os dias, e os dias se transformavam em semanas, e as semanas se transformavam em meses, e obviamente, os meses se transformaram em anos.
Com o tempo fui perdendo a noção do tempo. As coisas que eu lembrava como algo recente já não eram mais novidades. E tudo aquilo que eu estava consciente de que já não era nenhuma novidade, em um momento sempre acabava me surpreendendo do quão distante aquilo realmente estava.
É como quando alguém muito próximo tem um bebê e naturalmente você vai acabar acompanhando o crescimento dele. O tempo vai passando e uma hora é inevitavel parar e ver que a criança já fez, por exemplo, três anos. Então você olha para si mesmo e se pergunta: -O que eu fiz durante todos esses três anos? -e não obtém resposta alguma.
E graças a toda essa história eu acabo me sentindo como uma âncora, pesada demais para me levantar sem ajuda.

Leave a Reply